Léo Jaime: Gordo é o novo preto
Léo Jaime é ator, cantor e compositor
Rio - Quando Felipe França aqui desembarcou com três medalhas, uma de ouro e duas de bronze, vindo do último campeonato mundial de piscinas curtas, o que se comentava era seu peso. Com 100 kg e 14% de percentual de gordura, ele era mais do que um grande atleta: era a prova de que condicionamento e forma física não são necessariamente a mesma coisa. Tenho os mesmos 14% de percentual de gordura. Ao longo dos anos, fui aumentando de peso sem aumentar o percentual. A barriga cresce e é lá que guardo a perigosa gordura visceral. Estou sempre lidando com esta questão médica, e chata, mas tenho me mantido em forma e aumentado o peso magro, ou seja, adquirido músculos com exercícios. Portanto, posso dizer que estou bem condicionado. Dito isto, vamos ao real incômodo da minha condição. Chega de me justificar. Detesto fazer isto.
Ao longo dos anos ouvi, e ainda ouço, inúmeros “nãos” profissionais com a justificativa de que minha aparência não é boa, pareço decadente, etc. Passei 18 anos sem gravar, parecia que estava claro que minha barriga tinha substituído meu talento. Curiosamente, o público nunca acreditou nisso. Consegui vencer a resistência, mas não posso negar que ela exista e é forte. “Nadando contra a corrente, só pra exercitar”...
Voltando ao início: se um atleta pode ser medalha de ouro estando “acima do peso” seria correto dizer que existe um “peso” ideal? Nas Olimpíadas os atletas têm os mais variados tipos físicos e, sim, alguns são “gordos”. Mas vamos olhar por outro ângulo. Quando a adolescente lourinha matou os pais a pauladas em São Paulo, o comentário mais ouvido era “como foi que uma moça tão bonita fez uma coisa dessas?”. Como se gente bonita não matasse. Quando vi pela TV os bandidos fugindo da Vila Cruzeiro, não vi um bando de gordinhos. Eram até bem atléticos e “magros”.
O título deste artigo se refere a um movimento americano, “Fat is the new black”. Repare que a tradução não é “o novo negro” mas sim “o novo preto”. É uma expressão do mundo da moda: o novo preto é aquilo que parece ser a óbvia boa escolha, o que não tem erro, o pretinho básico. Todos são ou vão ser gordos, ou gostar de um gordo, ou admirar, ou ter prazer com um, seja em que nível for. Conviva com esta ideia. O desejo transcende a forma. Há um grande, um enorme preconceito. Este, sim, muito acima do peso. O preconceito contra os gordos é o único tolerado hoje em dia. Ou contra os feios, vá lá!
Está claro que, ao contrário do que a arte estabeleceu, através dos séculos, as formas arredondadas foram para o brejo. Mulheres, parem com essa obsessão de perder 2 kg! Homens gostam de mulheres companheiras, bem-humoradas e boas de cama. Homens, atenção! Quem repara demais na celulite das moças acaba preferindo bunda de rapaz. Não que eu tenha algo contra. Cada um que descubra o que lhe apraz. Brincadeiras à parte, deixe-me concluir. Não é preciso aceitar, mas tolerar. Eu é que não sei se tenho estômago para tolerar o preconceito.
Nenhum comentário:
Postar um comentário